ASSIS FALA DE TUDO E DA CANDIDATURA DE PEDRO BAPTISTA

Entrevista Francisco Assis, Vereador do PS na Câmara do Porto
"Interesses da região estão muito acima da fidelidade ao partido"Carla Soares(JN)
Francisco Assis esclareceu que não seria recandidato à Câmara portuense e logo abriu a corrida dos nomes. Para trás, estão críticas da Concelhia à sua actuação enquanto principal vereador da Oposição. Mas aquele que foi o cabeça de lista do PS desvaloriza e coloca a tónica nos atrasos e na resistência do partido em discutir uma coligação, que, já nas últimas autárquicas, defendeu sem êxito.Com saída marcada da Câmara do Porto para 2009, queixa-se da não preparação de uma coligação de Esquerda e nega que a falta de sintonia política com as estruturas concelhia e distrital tenham a ver com a sua não recandidatura. Nuno Cardoso para o Porto seria "uma possibilidade". E não poupa elogios a Teixeira dos Santos. Quanto a Narciso Miranda, está na altura do PS o valorizar.
JN Por que não se recandidata à Câmara do Porto?Francisco Assis Por uma razão muito simples, que já comuniquei ao presidente da Federação Distrital. Há mais de dois anos, já nas anteriores eleições autárquicas mas sobretudo depois delas, tenho vindo a defender a necessidade de, no Porto, se constituir, em alternativa à coligação de Direita que governa o município, uma aliança de Esquerda, que envolvesse o PS, o PCP e o BE em torno de um projecto comum para a cidade. Isso permitiria ao eleitorado fazer uma opção clara entre um projecto de continuidade em torno de uma solução conversadora de Direita e um projecto alternativo, de Esquerda plural. Ora, o que tenho vindo a verificar é que não há, aparentemente, vontade de seguir por este caminho. Há aqui um factor que considero fundamental que é o tempo. Isto devia ser mais do que uma mera soma aritmética de votos, com um projecto devidamente debatido e uma elaboração participada para que pudéssemos, de facto, ter uma solução coerente, sólida e mobilizadora. Este factor tempo tem vindo a escoar-se. Estamos a menos de dois anos das autárquicas. Nesse sentido, até para facilitar todo o processo de escolha dos candidatos, de mobilização do partido e elaboração de um projecto, entendi que era esta a altura própria para dizer claramente qual a minha posição. Isto não significa um afastamento em relação ao PS. Continuarei como vereador até ao final do mandato.
Em Janeiro, admitiu não estar “indisponível” para uma recandidatura, ressalvando que uma vitória dependia de a Esquerda se unir. O que mudou desde então?Passaram muitos meses. Um ano praticamente. E estamos exactamente no mesmo ponto.
Ficou isolado?Não tenho a certeza de que o partido não seja maioritariamente a favor da coligação, se chamado a pronunciar-se.
Mas Renato Sampaio e Soares Gaspar, líderes da Distrital e da Concelhia, dizem não fechar a porta a uma coligação. O primeiro ressalva que é um assunto a discutir aquando do próximo congresso.Sim. Tenho de admitir que eles ainda coloquem essa questão como uma possibilidade. Mas as coisas começam a retardar-se excessivamente. Estamos a muito pouco tempo do momento em que terão de ser feitas escolhas concretas. E, nesta altura, vejo como muito difícil a hipótese de uma coligação. Contudo, se for essa a opção do partido, muito bem. Também nunca fiz depender a existência dessa coligação de eu ser ou não candidato. O que para mim era evidente é que uma candidatura minha, para ter coerência, só podia surgir se essas condições estivessem preenchidas. Não estão e dificilmente ficarão.
Mesmo admitindo esse cenário, não espera para ver?Da minha parte não, porque há aqui um tempo que considero fundamental para consolidar essa coligação. Se essa for a opção do partido, respeitarei, mas será com outra pessoa, não comigo como candidato. Estarei, no entanto, disponível para participar, colaborando nos próximos actos eleitorais.
Ainda vão haver eleições internas, as lideranças podem mudar.Sim. Mas há uma continuidade e coisas que se têm de programar a longo prazo. O congresso distrital será já numa fase muito tardia. Estaremos a ano e meio das autárquicas. E há dinâmicas nacionais que, neste momento, não são favoráveis à concretização de uma coligação no Porto. Seria um pouco a contra-ciclo.
Não há condições a nível nacional?A actual dinâmica nacional, de conflitualidade entre os partidos à nossa Esquerda e o PS, não facilita uma coligação. Teríamos de ter construído condições excepcionais no Porto.
Falou com José Sócrates sobre a não recandidatura e a coligação?Não, nunca falamos sobre isso. É um assunto que hoje deve ser fundamentalmente tratado a nível distrital e concelhio.
Não concorda com o argumento de Renato Sampaio de que, primeiro, é preciso que PCP e BE se pronunciem?O PS tem sempre a incumbência de liderar estes processos. É o maior partido, o que confere responsabilidades especiais.
A falta de apoio político impede-o de ser candidato? A Concelhia, por exemplo, criticou publicamente a falta de uma oposição eficaz por parte dos vereadores do PS.Não. Desvalorizei isso. Faz parte da vida política e temos de saber conviver com essas situações.
Sentiu apoio político para uma recandidatura?Tal questão nunca se colocou. Por isso, nunca senti ou deixei de sentir esse apoio. Quem quer ser candidato bate-se e tem de construir as condições para esse apoio político. Não posso cometer a injustiça de dizer que o teria ou não.
E há condições a partir do momento em que a Concelhia, que é quem indica o candidato, critica a oposição que tem feito na Câmara?Não faço considerações públicas sobre isso. Em termos de linha de orientação de fundo não tenho razões para afirmar uma coisa ou o seu contrário.
Também em Janeiro, disse que o PS ia passar a ter uma actuação “mais dura e visível” na Câmara. Que no primeiro ano de mandato é natural que se respeite um certo estado de graça do vencedor. Não concretizou essa promessa…Há um primeiro ano de mandato em que temos de dar tempo a que uma maioria novamente legitimada crie as condições de concretização dos seus compromissos eleitorais. A partir daí, o grau de exigência aumenta. E foi isso que aconteceu. Veja o caso do Rivoli. Avançámos com uma providência cautelar e deram-nos razão. Assumimos aí um combate claro. Também agora com o orçamento municipal, deixámos claras as grandes linhas de divergência.
Considera suficiente a oposição que é feita?Fazemos uma oposição selectiva, em que separamos as coisas. Admito que isto não seja do agrado de toda a gente. Cada um tem o seu estilo. Eu tenho um estilo muito institucionalista de fazer oposição. Ela deve fazer-se fundamentalmente nos órgãos próprios. E, estando nós na Câmara, fazemo-la muito a partir das reuniões. Em segundo lugar, fazemos uma oposição exigente. O facto de estarmos nesse papel, não nos desresponsabiliza quanto à obrigação de fazer propostas sérias. Sempre que critico a actual maioria, procuro pensar o que faria se estivesse no seu lugar. Faria diferente? Há casos em que faria igual. Por exemplo, nunca ninguém me ouviu dizer que Rui Rio está a fazer uma política errada em termos de gestão financeira. Penso que está a fazer a política correcta. Assim como a nível da gestão dos recursos humanos no essencial. Há um aspecto que me repugna que é a forma populista como às vezes ataca os funcionários na praça pública. Porém, a forma como reorganizou a Câmara e o grau de exigência em relação aos funcionários parecem-me correctos. Agora, há áreas em que temos divergências profundas. Rui Rio faz bem aquele papel, mas depois faz muito mal o outro, que é o do perceber a Câmara como um agente fundamental do desenvolvimento, da afirmação e da projecção da cidade. Isso é ele totalmente incapaz de fazer. E é em torno disso que temos de construir uma alternativa.
O PS conseguiria construir essa alternativa com o PCP e o BE?Estou convencido de que sim. Hoje, conheço bem Rui Sá. É um homem com muito bom senso e uma visão para a cidade que não é substancialmente diferente da nossa. Conheço bem algumas pessoas do BE, a começar por João Teixeira Lopes e tenho a mesma opinião. Nas nossas divergências, que são algumas certamente, mas sobretudo nas nossas convergências, que são muitas, seríamos capazes de construir um projecto de cidade que perspectivasse três questões fundamentais. Em primeiro lugar, o Porto tem que voltar a ser um grande centro económico da região. Para isso, é necessário sensibilizar o poder central e estabelecer articulações com o tecido universitário e empresarial. Em segundo lugar, tem que ter outra capacidade de captação de investimentos e se qualificar. E, em terceiro, tem que superar a enorme crise social. A cidade está cada vez mais polarizada, entre gente que vive muito bem e gente que vive mal. O Porto está mais pobre e tem menos importância do que há seis anos atrás. Não é fácil contrariar tudo isto porque está inserido num ciclo de perda de importância de toda a região. E são necessárias políticas especiais. É por isso que o Governo tem de olhar de outra maneira para o Porto. E o presidente da Câmara tem de se bater para que o faça. Só se contraria a tendência declinante da região com investimentos extraordinários.
Referiu que prefere uma oposição institucional. Mas aprovou a passagem da periodicidade das reuniões para quinzenais. Isso não diminui a capacidade de intervenção?Em 90% das câmaras, as reuniões são quinzenais. Por que razão devem ser semanais no Porto. Há um ganho de eficiência. A ideia de que uma oposição mais barulhenta e mais constante é melhor é falsa.
E a assembleia extraordinária pedida por causa do Rivoli? Os socialistas não apresentaram propostas…Houve um erro crasso de início que assumo e aceitei em nome da pacificação do partido: fui responsável pela elaboração da lista para a Câmara mas não pela feitura da lista para a Assembleia, à excepção do líder, Pedro Bacelar Vasconcelos. O que tem vindo a verificar-se é uma dificuldade de articulação. Os aspectos e as preocupações a que os vereadores são sensíveis não são os mesmos a que os membros da Assembleia Municipal são sensíveis. E as soluções preconizadas não são sempre as mesmas.
Divergências com Renato Sampaio e com o Governo em dossiês fundamentais têm a ver com a sua não recandidatura. Retiram-lhe condições políticas?Não acho.
Temos o caso do metro do Porto, em que considerou errado o Governo querer ser o maior accionista; criticou o modelo proposto para a Área Metropolitana e, nas mudanças na RTP, condenou a satisfação do líder distrital após uma reunião com a administração…Há uma questão que, para mim, foi sempre essencial. Entre outras coisas, fui candidato do PS à Câmara e sou vereador. A defesa daquilo que, na minha perspectiva, são os interesses do Porto e da região estão muito acima da fidelidade ao partido. Sou leal para com o PS e o Governo, e concordo com as suas linhas de orientação no essencial, mas tal não significa que não tenha divergências em decisões concretas que afectaram negativamente a cidade e a região.
Partilha das críticas feitas a Renato Sampaio, de que não defende os interesses da região?Tenho consciência de que ser líder do PS/Porto, num momento em que o partido governa o país e que não é particularmente brilhante para a região, é uma situação muito ingrata. A mim não me inibe mas cada um tem o seu estilo. Hoje, enquanto autarca e eurodeputado, sinto-me bastante mais livre do que quando era presidente da Distrital.
Admite integrar alguma lista nas próximas autárquicas?Não. Para mim, é uma questão totalmente decidida. Se algum dia voltasse a ponderar uma candidatura seria evidentemente à Câmara do Porto, nunca seria a outra. Porém, estou disposto a colaborar activamente com o partido e não quero estabelecer qualquer confronto com a Concelhia.
Até às autárquicas, serão eleitas novas estruturas. Consta que tem estado em contacto com Narciso Miranda no sentido de uma alternativa à Distrital.Não tenho conversado com ninguém nesse sentido.
Consta também que socialistas próximos de si, como José Luís Carneiro e Manuel Pizarro, foram sondados…Mas não foram consultados por mim. Nem incentivei, nem incentivo qualquer candidatura à Distrital. Tomarei uma posição na altura em que se discutir essa questão e em que surjam as várias candidaturas.
O que pensa da candidatura de Pedro Baptista?É um homem com qualidades, indiscutivelmente. É inteligente, culto e, independentemente do resultado, pode contribuir fortemente para que haja um debate sério no interior do PS.
Admite apoiá-lo?Não tenho, neste momento, qualquer posição.
Não vai integrar uma lista à Distrital?Também não digo que não vá. Candidato não serei.
Já é altura de o PS ponderar novamente uma candidatura autárquica de Narciso Miranda?Em Matosinhos, há uma câmara socialista cujo presidente está a fazer um trabalho sério e digno. Agora, é evidente que Narciso Miranda deve ser valorizado pelo PS. Sobre ser candidato ou não, isso depende da vontade dele. Ele foi, durante muitos anos, uma referência do partido. Representa um certo PS e é evidente que o partido tem não só o dever como também interesse em valorizar uma personalidade como ele. Ainda representa algo de importante para o PS, é um activo. Mas também devo dizer-lhe que tenho a noção de que a actual distrital está aberta a essa valorização.
E para o Porto? Como vê um eventual regresso de Nuno Cardoso?Vejo como uma possibilidade, como as demais. Li vários nomes. Todos são respeitáveis. Mas não estou disponível para colaborar no processo de selecção do candidato.
E o ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, seria uma boa opção?Teixeira dos Santos é um extraordinário ministro das Finanças. É hoje uma das grandes referências do nosso Governo. Foi, sem sombra de dúvida, a personalidade política que mais se afirmou nos últimos tempos.