EUA-ELEIÇÕES AMERICANAS E A ANÁLISE DO PÚBLICO
Chip Somodevilla/Reuters
O resultado teoricamente favorece Barack Obama
Eleições norte-americanas
EUA: O ambiente era explosivo mas o primeiro debate presidencial foi tépido
27.09.2008 - 10h18 Rita Siza, em Oxford, Mississippi
O drama que rodeou a realização do primeiro debate televisivo entre os dois candidatos à presidência dos Estados Unidos abrira a porta a uma sessão política explosiva e potencialmente decisiva para o desfecho da eleição, com o país na expectativa para ver se o imprevisível republicano John McCain voltava a tirar um coelho da cartola capaz de provocar uma reviravolta na campanha, ou se o cândido democrata Barack Obama era capaz de desferir golpes suficientes para levar o seu adversário ao tapete.Afinal, o evento não consagrou ou arrasou nenhum dos concorrentes — a 40 dias da eleição, ainda só é seguro dizer que está tudo em aberto. Depois de ter ameaçado não tomar parte no evento, a pressão era maior sobre o republicano John McCain, que viu a sua candidatura cair nas sondagens ao longo da última semana. Mas, em Oxford, a tarefa do democrata Barack Obama era tudo menos simples: não é pelo seu desempenho em debates que o senador do Illinois é classificado como um orador brilhante.Como se supunha, Barack Obama saiu ao ataque na economia, uma área onde é supostamente mais forte (segundo as últimas sondagens, mais de 50 por cento dos americanos dizem confiar mais no democrata para lidar com a economia). O tema não fazia parte do guião inicial, mas os desenvolvimentos da semana, com as negociações para a aprovação de um pacote de emergência para evitar o colapso dos mercados financeiros, tornaram o assunto inevitável.Os dois candidatos começaram por evitar uma resposta concreta à primeira pergunta da noite — “qual é a vossa posição sobre o plano de resgate financeiro de Wall Street proposto pela Administração?” —, mas rapidamente envolveram-se num vivo confronto sobre o controlo da despesa federal, a revisão do código fiscal, a regulação dos mercados, a reforma do sistema de saúde, a exploração petrolífera e a energia nuclear.Ao longo da noite, McCain e Obama discordaram na forma de gerir o orçamento de estado e de conduzir a retirada das tropas do Iraque; as suas respostas revelaram dois candidatos com visões ideológicas bem diferentes e planos de governo bem distintos.Obama não desistiu de ir ao ataque quando o debate virou para a política externa e segurança nacional, as áreas em que McCain é especialista. Sucessivamente disse que McCain estava errado na sua avaliação da guerra do Iraque e também do Afeganistão. “Os nossos recursos foram todos gastos no Iraque. Enquanto isso, Bin Laden ainda não foi capturado. E a Al-Qaeda ressurgiu”, lamentou.Mas nessa fase do debate o democrata notoriamente perdeu o fulgor inicial e viu o republicano assumir a ofensiva. McCain tentou caracterizar Obama ora como ingénuo ora como irresponsável, constantemente iniciando as suas respostas com expressões como “o que o senador não compreende” ou “o que Obama não sabe”. Como contraponto, o republicano exibiu conhecimento enciclopédico ao falar em detalhe sobre o Irão, Paquistão ou Rússia, nomeando os lugares por onde passara e chamando os líderes desses países pelo nome. E fustigou o seu opositor pela sua abertura para ignorar a soberania do Paquistão para abater Bin Laden ou para reunir-se com Mahmoud Ahmadinejad. “Essas coisas não se dizem em voz alta”, aconselhou.“Quando um candidato diz que o seu oponente está certo onze vezes, como Obama disse, está a reconhecer que é essa pessoa que tem o comando da situação. O candidato que concorda com o que diz o seu oponente é aquele que está a perder e tem de jogar na defensiva”, interpretava Steve Schmidt, o director de campanha de McCain, no final do debate.A opinião dos porta-vozes do candidato democrata era obviamente diferente. “A missão de Barack Obama esta noite era mostrar aos aos americanos, com toda a confiança, não só que é familiar com a imensidão e a complexidade das questões de política externa como está habilitado para lidar com elas. Ele estabeleceu as suas credenciais, e sem qualquer dúvida demonstrou o seu carácter calmo, forte, confiante e a sua capacidade de liderança”, considerou Greg Craig, um dos conselheiros de Obama.Sentado na plateia, Tyler Clemons, o director do jornal da universidade “The Daily Mississippian”, achou que a postura de McCain ao discutir a política externa foi excessivamente condescendente e até mesmo “paternalista”. “Pareceu-me que ele se pôs na posição do avozinho, que está sempre a dizer que já viveu muito e por isso sabe o que é melhor para os seus netos. Mas duvido que seja uma boa táctica lembrar aos eleitores que ele já tem muita idade”, comentou ao PÚBLICO.Jamie Johnson, uma estudante de Ciência Política que ganhou um bilhete para o auditório, considerou que e deu crédito “Sairam-se bem os dois”, notou. A sua avaliação final era que, apesar de animado e interessante, o debate foi também previsível. “Não ouvi nada de novo e nada do que os dois candidatos disseram me fez mudar as ideias que tinha sobre eles e a minha intenção de voto”, revelou.Obama não mudou a sua estratégia de associar John McCain às políticas de George W. Bush. Fê-lo na economia, ao dizer que a crise de Wall Street “é o veredicto final de oito anos de políticas económicas falhadas, promovidas por George Bush e apoiadas pelo senador McCain”. Fê-lo na resposta às críticas de John McCain, quando este procurou usar o registo de voto de Obama no Senado para o descrever como um ultra-liberal. “Isso é porque eu estava constantemente a votar contra George W. Bush”, insistiu.E fê-lo também na política externa, acusando os dois republicanos de terem uma visão das relações internacionais limitada pela guerra do Iraque. “O próximo Presidente vai ter que ter uma visão estratégica alargada sobre todos os desafios que enfrentamos”, sublinhou Obama.McCain também não se desviou da linha de ataque que vem repetindo ao longo da campanha: Obama não está preparado para ser comandante-em-chefe dos Estados Unidos. Já perto do final, resumiu essa ideia numa frase para desqualificar a candidatura do democrata. “Honestamente, não acredito que o senador tenha o conhecimento ou a experiência, e ele revelou mau julgamento numa série de áreas”, declarou.Sem “gaffes”, nem erros ou surpresas, a sessão terminou sem que se produzisse uma frase memorável — cautelosos, os candidatos procuraram sobreviver sem arranhões. Talvez por isso, a linha que regista em directo a reacção dos espectadores manteve-se constante durante toda a emissão, sem picos que indicassem um acesso de entusiasmo ou desilusão por parte dos eleitores republicanos, democratas ou independentes que constituíam a amostra.Estabelecido o empate, não podia ter ficado mais alta a fasquia para os dois próximos confrontos. O resultado teoricamente favorece Barack Obama, que já deixou para trás o assunto onde tem mais desvantagens face a McCain. Os analistas concordavam que era mais importante para John McCain ter sido aclamado como o vencedor, não só porque a política externa é a pedra de toque da sua candidatura, mas também porque o seu comportamento errático durante a semana suscitou dúvidas aos eleitores.
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